O que são alergias?
As alergias são reacções exageradas do sistema imunológico a substâncias comuns que normalmente não causariam uma resposta em pessoas não alérgicas. Essas substâncias são chamadas de alergénicos e podem ser encontradas no empoeiramento doméstico, pêlos de animais, em pólenes, em alimentos, medicamentos e produtos químicos, por exemplo.
Quando uma pessoa alérgica é exposta a um alérgeno, o sistema imunológico reage exageradamente com alterações inflamatórias que vão dar início aos sintomas, com graus variáveis de gravidade, como erupções cutâneas, comichão, espirros, tosse, edema, dificuldade em respirar, náuseas e diarreia.
Além dos factores ambientais que desencadeiam a resposta inflamatória característica da alergia, existem também factores genéticos que predispõem para a alergia. Assim, é desta interacção entre a genética e o ambiente que surgem as doenças alérgicas.
Os alergénicos mais prevalentes em ambiente “indoor” são os ácaros e os animais domésticos.
Os ácaros são da família dos aracnídeos e existe uma multiplicidade de espécies, muitas delas com repercussão ainda mal conhecida na saúde.
Os principais ácaros presentes no empoeiramento doméstico são o Dermatophagoides pteronyssinus e Dermatophagoides farinae e mais recentemente o Lepidoglyphus destructor, um ácaro de armazenamento, inicialmente mais prevalente em locais de armazenamento de alimentos, como cereais e farinhas, mas que nos dias de hoje se tem identificado frequentemente no pó de habitações e tem um grande poder alergisante.
O número de ácaros presente no pó doméstico depende de três factores principais que são a temperatura (entre os 20º e 30ºC), a humidade (superior a 60%) e a disponibilidade de alimentos (partículas resultantes da descamação da pele humana e dos animais domésticos, fungos e outros produtos orgânicos presentes no empoeiramento doméstico).
Estes factores, quando optimizados, favorecem o crescimento de ácaros, o que tem repercussão no aparecimento de sintomas.
Outro factor que também favorece o crescimento de ácaros é a baixa altitude.
No interior das habitações os animais de estimação, gato e cão fornecem os principais alergénicos que estão presentes no pêlo e caspa/detritos de pele, mas também na urina e saliva. Por vezes, outros animais domésticos como hamsteres podem ser os responsáveis de alergia.
Os fungos, sobretudo em habitações com infiltrações e humidade, são também uma fonte de alergénicos a considerar.
Os pólenes são os alergénicos mais importantes do ambiente exterior, que provocam sintomas de doença alérgica.
São estruturas microscópicas encontradas nas plantas, que contêm as células reprodutivas masculinas, sendo responsáveis pela polinização das flores e pela transferência do material genético masculino para o óvulo da flor, o que leva à produção de sementes e frutos.
Os grãos de pólen são produzidos pelas anteras das flores masculinas e são dispersos pelo vento, água, animais ou insetos para alcançar o estigma. Variam em tamanho, forma e textura, e são característicos de cada espécie vegetal, o que permite que sejam usados para identificar plantas e estudar a ecologia das espécies vegetais.
Cada espécie vegetal tem um período de polinização específico, que pode variar de acordo com a região geográfica, clima, altitude e outras condições ambientais. Algumas plantas têm um período de polinização curto, de apenas alguns dias ou semanas, enquanto outras podem ter um período de polinização mais longo, que dura meses. Também, a época de polinização pode variar entre plantas de espécies diferentes que crescem na mesma região. Por exemplo, algumas espécies de plantas podem florescer na primavera, enquanto outras podem florescer no verão ou no outono. É importante conhecer o período de polinização de uma determinada espécie de planta de modo a poder estabelecer uma correlação entre o período de polinização e o aparecimento de sintomas e, assim, implementarem-se medidas de prevenção. Os pólenes que mais frequentemente provocam alergias são os de gramíneas, oliveira, plátano, parietária, artemísia, plantago e chenopodium.
Os alergénicos alimentares são substâncias presentes em determinados alimentos que desencadeiam uma resposta imunológica anormal em algumas pessoas, conhecida como alergia alimentar. Os alimentos que mais frequentemete provocam alergias são o leite, ovo, amendoim, nozes, peixes, mariscos, trigo e soja. No entanto, muitos outros alimentos podem causar alergias.
Embora a alergia alimentar seja mais frequente em crianças, pode surgir em qualquer idade.
Os alergénicos de medicamentos são substâncias químicas presentes nos medicamentos e podem desencadear uma reacção alérgica em algumas pessoas, que se denomina alergia a medicamentos. Os mais frequentes estão presentes em antibióticos, anti-inflamatórios, anestésicos e agentes quimioterápicos, entre outros.
Estes alergénicos de medicamentos podem ser alergisantes em pessoas sensibilizadas e desencadearem reacções alérgicas com graus variáveis de gravidade e sintomatologia diversa como urticária, angioedema, dificuldade respiratória, anafilaxia e nos casos extremos podem provocar a morte.
Os alergénicos de insectos são proteínas presentes no corpo ou nas fezes dos insectos, que podem desencadear reacções alérgicas em algumas pessoas. Os insectos que mais frequentemente causam reacções alérgicas incluem baratas, abelhas, vespas, formigas e mosquitos.
As reacções alérgicas podem ser locais com edema e rubor na pele da zona da picada, comichão e dor, que causam incomodo mas são de pouca gravidade, e reacções sistémicas, em que os sinais e sintomas são generalizados, com manchas na pele em todo o corpo, tosse, dificuldade em respirar, sensação de aperto na garganta, vómitos, diarreia, ou mesmo anafilaxia.
Existem várias doenças alérgicas que afectam diferentes partes do corpo e podem ter sintomas variados. Algumas das principais doenças alérgicas são a rinite alérgica, asma brônquica, dermatite atópica, urticária, anafilaxia, alergia alimentar, alergia a medicamentos e a venenos.
O diagnóstico de alergia envolve uma avaliação completa da história clínica e exame físico. A confirmação da existência de uma alergia é efectuada através da realização de testes cutâneos. Existem três tipos de testes cutâneos.
Testes por picada, em que se aplica uma gota do alergénio sobre a pele do braço e se realiza uma picada leve, com uma lanceta, sobre cada gota. São positivos se surgir uma pápula no local da picada ao fim de 15 a 20 minutos. Estes testes são muito utilizados e muito úteis para o diagnóstico de alergias respiratórias, alergias alimentares, alergias a medicamentos e alergias a veneno de himenópteros.
Os testes intradérmicos consistem numa injecção intradérmica de uma pequena quantidade do medicamento diluído, ou do veneno de himenóptero diluído, com aumentos progressivos da concentração até se atingir uma concentração máxima não-irritativa.
A leitura é realizada aos 15-20 minutos para uma reacção imediata, ou nos dias seguintes no caso de se avaliar uma reacção tardia.
De salientar que estes testes podem desencadear uma reacção generalizada pelo que deverão ser realizados apenas por profissionais com experiência e em meio hospitalar. Estes testes são um pouco mais dolorosos, mas também podem ser realizados em qualquer idade, dependendo da tolerância individual.
Nos testes epicutâneos aplicam-se uns adesivos nas costas permanecendo durante 48 horas.
A leitura destes testes é feita ao fim de 48 horas, podendo, em casos selecionados, a leitura ser diferida às 72 ou 96 horas.
Estes tipos de teste são bastante úteis para o estabelecimento etiológico de dermatites de contacto alérgicas e algumas reacções tardias a medicamentos.
O risco destes testes é muito baixo, mesmo em doentes com história de reacções graves aos medicamentos.
Podem também ser efectuadas análises ao sangue para medir a quantidade de anticorpos IgE produzidos em resposta a um alérgeno específico no sangue do doente. Esses testes são especialmente úteis para doentes que não podem fazer testes cutâneos, como aquelas que tomam medicamentos que podem interferir nos resultados.
Outros testes são os de provocação para determinar se um doente é alérgico a um alérgeno específico. O doente é exposto ao alérgeno suspeito numa quantidade controlada para observar se ocorre uma reacção alérgica.
O diagnóstico de alergia é importante para que o doente possa evitar os alergénicos desencadeantes e poder efectuar um tratamento adequado.
O tratamento das doenças alérgicas depende do tipo e gravidade dos sintomas apresentados pelo doente.
Genericamente, alguns dos princípios orientadores incluem, desde logo, a implementação de medidas de evicção dos alergénicos responsáveis pela alergia, o que pode envolver medidas específicas de acordo com cada alérgeno. Evitar a ingestão ou contacto com determinados alimentos, manter a habitação livre de poeira, manter animais de estimação fora de determinados zonas e evitar a permanência ao ar livre quando os níveis de pólen estiverem altos, são alguns exemplos.
Os medicamentos para alergias destinam-se a aliviar os sintomas da alergia e também são usados para controlo de fundo, evitando que surjam de novo os sintomas.
A imunoterapia especifica, também conhecida como "vacina contra alergia", é usada para modificar a resposta exagerada do sistema imunitário aos alergénicos em causa. Envolve a exposição gradual do doente a quantidades crescentes de alergénicos para ajudar o organismo a desenvolver tolerância.
A administração de adrenalina pode e deve ser utilizada de emergência para tratar reacções alérgicas graves, como anafilaxia. É importante que as pessoas com alergias graves, como a alergia ao veneno de himenopteros, tragam consigo uma “caneta“ de adrenalina e saibam como usá-la corretamente.
O tratamento para as alergias pode ser altamente eficaz para o controlo dos sintomas e para melhorar a qualidade de vida do paciente.
Dr. Carlos Loureiro, Imunoalergologista
Hospital São Francisco | Leiria
Clínica São Francisco | Pombal